8 DE JANEIRO

Um guia para abordar os atos antidemocráticos um ano depois

Ataque à democracia

Em 8 de janeiro de 2023, a democracia brasileira sofria um atentado golpista. Com vandalismo, invasões e depredações, Brasília foi ameaçada por uma multidão de extremistas apoiadores de Jair Bolsonaro. Agora, um ano depois, qual a visão remanescente desse acontecimento?

Para esse episódio do Como Falar Sobre, o nosso assunto é o 8 de janeiro. Conversamos com mulheres jovens e conservadoras para entender o que restou da narrativa que, um ano atrás, gerou tanto afastamento da figura de Jair Bolsonaro. 

Esse público foi escolhido pois é formado por pessoas que votaram em Bolsonaro no segundo turno, elas condenavam os atos, mas não atribuíam responsabilidade a Jair e queríamos entender as razões disso e os argumentos mais persuasivos.

8 pontos narrativos sobre o 8 de janeiro

1. O 8 de janeiro ainda é uma data viva

Quando pedimos para criarem uma linha do tempo com os acontecimentos políticos mais importantes do ano, o 8 de janeiro aparece sempre como uma das primeiras lembranças. Mas mais do que ter os atos antidemocráticos na memória, todas as pessoas os classificam como ruins, violentos e até mesmo terroristas.

 

2. Um ato contra a imagem do Brasil

Segundo o público que trabalhamos, os atos antidemocráticos não foram simplesmente uma manifestação de insatisfação de uma parte da população. Na realidade, eles foram um atentado contra a democracia, contra até mesmo a moral dos brasileiros, pois a imagem do país todo ficou manchada depois do 8 de janeiro.

 

3. Quem foi o responsável?

A maioria das pessoas não responsabiliza Bolsonaro diretamente pelos atos. Elas vão para um lado bem literal: “eu não vi ele chamando as pessoas pros ataques”, ”ele não estava lá”... E de fato, elas concordam que não houve um único culpado:

  • a polícia cruzou os braços por horas;

  • exército prometeu proteção (e até fez escolta);

  • empresários ricos financiaram ônibus e acampamentos em frente aos quartéis (70 dias de refeições, gente!);

  • veículos de mídia multiplicaram fake news e reforçaram discurso de ódio;

  • pastores incitaram seus fiéis a não reconhecer o resultado das eleições;

  • vereadores, deputados, senadores e influenciadores digitais apoiaram os atos golpistas nas redes sociais. 

Todos eles fechados com Bolsonaro. Para que isso fique claro, seu trabalho aqui vai ser o de costurar fatos já comprovados pelas investigações para que a ficha da pessoa vá caindo.

 

4. E o Bolsonaro?

A responsabilidade de Jair é muito mais relacionada à sua omissão. Todo mundo reconhece que ao se manter calado e fugir para os Estados Unidos, Bolsonaro abriu margem para que seus seguidores fizessem o que queriam.

“Quem cala, consente”

Dessa forma, é mais fácil persuadir as pessoas a verem como o silêncio dele foi causador dessa violência toda, mas é bem importante lembrá-las do quanto outras atitudes (incentivo à posse de armas, disseminação de fake news, falsas acusações contra as urnas e incitação contra o STF/TSE) também o culpabilizam.

 

5. Chame as coisas pelo nome

Logo que o 8 de janeiro aconteceu, era necessário tratar desse assunto com muito cuidado, medindo bem os termos e adjetivos. Agora, entretanto, o imaginário coletivo já definiu os atos como imperdoáveis, então não tenha medo de utilizar palavras mais fortes, como violência, terrorismo, crime e fanatismo, por exemplo.

 

6. Manifestantes de esquerda X direita

Até mesmo esse público mais conservador reconhece que as manifestações de esquerda são amplamente reprimidas pelas forças de segurança, ao contrário do que ocorreu nos atos golpistas. A ineficiência e a omissão da polícia, segundo quem ouvimos, é uma das grandes responsáveis pelo 8 de janeiro. Por isso, vale muito a pena fazer essa comparação com elementos visuais que ilustrem essas diferenças.

“Se a polícia tivesse agido, nada daquilo teria acontecido”

 

7. Visão de impunidade

Por mais surpreendente que soe, esse público não conhece os desfechos do 8 de janeiro. Não sabe da existência da CPMI, ou dos processos judiciais e muito menos das condenações dos criminosos.

Essas pessoas estão convencidas da necessidade de punir os arruaceiros. No entanto, a falta de informações sobre o progresso das ações judiciais contra esses indivíduos leva-as a pensar que eles estão escapando sem punição, o que dá uma sensação de que um novo 8 de janeiro poderia ocorrer, afinal ninguém foi reprimido.

8. No final das contas, o 8 de janeiro não afasta as pessoas do Bolsonaro

Uma esperança muito grande do campo progressista era que o 8 de janeiro seria uma efeméride que afastaria as pessoas do bolsonarismo, isso, um ano depois, não se confirma. Ainda que depois da nossa conversa as pessoas que ouvimos concordem que Jair teve responsabilidade pela ocorrência dos atos antidemocráticos, isso não as faria mudar seu voto de 2022. É importante manter isso em mente porque o que está em disputa é a ampla responsabilização dele, e não o distanciamento com os ideais defendidos por ele. A questão que fica é: por que essas pessoas responsabilizam Bolsonaro por um ato terrorista e ainda assim não mudam seu voto?

Acreditamos que a oposição ao longo desse primeiro ano de mandato do Lula, embora não seja tão barulhenta quanto já foi, tem conseguido aumentar a rejeição a Lula a tal ponto que mesmo que Bolsonaro não seja mais o político ideal, acabam por preferi-lo na comparação com o atual presidente. Interessante ficar de olho nisso.

Recomendações

  • Não adianta tentarmos convencer os bolsonaristas que já foram convertidos ao extremismo, temos que focar em quem ainda tem salvação. Por isso, nosso público são aquelas pessoas que votaram em Bolsonaro, sim, mas apenas no segundo turno, que acabaram escolhendo ele mais por não quererem votar em Lula de forma alguma. Além disso, é interessante ter um recorte de idade, focando na juventude — que é sempre mais adepta à conversa.

  • O Instagram é a rede social que esse público mais utiliza para se informar sobre o mundo. Dessa forma, nesse 8 de janeiro temos um objetivo: aumentar a quantidade de postagens no Instagram sobre o assunto.

  • Ainda que lembrem do 8 de janeiro de forma negativa, a maioria das pessoas esqueceu da gravidade dos atos golpistas. Por isso, trazer imagens, vídeos ou notícias que mostram na íntegra tudo o que aconteceu naquele dia faz com que esse público fique alarmado, chocado e até mesmo indignado. Especialmente as cenas em que os criminosos atuaram contra animais, machucaram policiais e deixaram toda a bagunça para os funcionários dos prédios da Praça dos Três Poderes limparem.

  • É de suma importância divulgar os desenvolvimentos jurídicos dos casos que envolvem os criminosos do 8 de janeiro. Isso para demonstrar que as punições estão de fato sendo aplicadas e acabar com essa imagem de impunidade veiculada aos terroristas.

Metodologia

Foram realizados 04 grupos de discussão online com mulheres que declaram se interessar e conversar um pouco sobre política no seu dia a dia. Selecionamos quem votou em qualquer candidato no primeiro turno das eleições de 2022, menos em Bolsonaro, mas que no segundo turno, votou em Bolsonaro como opção para presidência do Brasil. Também foi filtro no recrutamento o entendimento de que nenhuma delas acredita que as eleições foram fraudadas e tão pouco participaram de alguma manifestação online ou nas ruas contra o resultado das eleições.

A composição da amostra considerou moradoras de Porto Alegre, de 18 a 25 anos, da classe C, de diferentes religiões, configuração de lares e raça, que foram ouvidas nos dias 04 e 05 de dezembro de 2023.

Em relação ao 8 de janeiro, excluímos da amostra mulheres que concordam com a ação de manifestantes bolsonaristas que ocuparam o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o STF. E organizamos os grupos a partir da avaliação sobre a responsabilização de Bolsonaro em relação a invasão dos prédios dos três poderes, sendo:

  • 02 grupos com mulheres que responsabilizam Bolsonaro pela invasão do Congresso Nacional, Palácio do Planalto e STF;

  • 02 grupos com mulheres que não responsabilizam Bolsonaro pela invasão do Congresso Nacional, Palácio do Planalto e STF.